segunda-feira, 19 de julho de 2021

Os Castro e Silva de Cascavel - Ceará

O açoriano José de Castro e Silva (1709-1784), patriarca da família Castro e Silva, aportou no Ceará por volta de 1745, desembarcando no povoado de Aracati. Casou-se em 27/05/1748 na Fazenda Passagem das Pedras (hoje situada na cidade de Itaiçaba) com Anna Clara da Silva Cruz (1732-1790), filha de Antônio Silva da Cruz (natural da Freguesia do Espírito Santo em Lisboa) e de Teresa Maria de Jesus (viúva de José Ferreira Collaço e descendente da família Bezerra de Meneses). José foi proprietário de terras no Palhano e do sítio Juazeiro, herdado por seu filho João. Seus 10 filhos nasceram, foram criados e educados no sítio Juazeiro, próximo a cidade de Aracati.  

Os dois filhos mais velhos ocuparam os principais cargos da cidade de Aracati. O primogênito era o coletor de impostos e tesoureiro na localidade e o segundo filho foi Capitão-Mor da cidade. Já no final do século XVIII, os Castro e Silva detinham poder político e econômico da província do Ceará e mantinham prepostos em Fortaleza, cidade que naquela época representava o poder militar. Talvez por falta de oportunidade em Aracati, outros quatro filhos de José foram morar em outras cidades do Ceará, sendo um em Fortaleza (capital da província), um em Sobral (região norte) e dois em Cascavel (vila situada a meio caminho entre Aracati e Fortaleza). Os dois filhos que se fixaram em Cascavel, o Capitão Francisco Xavier de Castro e Silva (1764-?) e o Padre Joaquim José de Castro e Silva (1772-1824), vieram para a vila por volta de 1789.

Francisco Xavier, o mais velho dos dois, ocupou o posto de capitão de ordenanças na vila de Cascavel. A estrutura militar lusitana do último terço do século XVIII, que se transferiu para o Brasil, se dividia basicamente em dois tipos específicos de força: os Corpos Regulares (conhecidos também por Tropa Paga ou de Linha) e os Corpos Irregulares ou de Ordenanças. Os Corpos Regulares formavam o exército “profissional”, sendo a única força paga pela Fazenda Real. Essa força organizava-se em regimentos, terços e companhias, cujo comando pertencia a fidalgos de nomeação real. Teoricamente, dedicavam-se exclusivamente às atividades militares.

Os Corpos de Ordenanças, conhecidos por paisanos armados, possuíam um forte caráter local, pois eram recrutados dentre os indivíduos da população masculina da localidade. Os componentes do Corpo de Ordenanças não recebiam soldo, permaneciam em seus serviços particulares e, somente em caso de grave perturbação da ordem pública, abandonavam suas atividades. Os postos do Corpo de Ordenanças de mais alta patente eram na ordem de hierarquia: capitão-mor, sargento-mor e o capitão de ordenanças.

Os capitães-mores, além de funções militares, eram também responsáveis por representar o governo e chefiar parte da administração pública na sua cidade. A maior parte da administração pública era exercida pelos indivíduos eleitos da Câmara (hoje vereadores) que formavam o Conselho da vila ou cidade. O cargo de capitão-mor era perpétuo, ocupado pelas “pessoas principais” do local e conferia a seus ocupantes “nobreza vitalícia”.

O posto de capitão de ordenanças, hierarquicamente inferior ao de capitão-mor, era em muitos casos, a porta de entrada para os nomeados atestarem seu valor e conseguirem alcançar uma patente mais alta. O capitão de ordenanças era responsável por recrutar os indivíduos que formavam a força militar local e por comandar, em caso de necessidade, as companhias dos regimentos.

O Capitão Francisco Xavier comandou o corpo de ordenanças de Cascavel até o seu falecimento. Casou-se em 08/06/1790, na capela de Nossa Senhora do Ó de Cascavel, com Anna Thereza de Jesus (1769-?). Dessa união nasceram três filhos, que se tem conhecimento da existência deles: Rita Angélica de São Francisco (1791-1880), Manoel de Castro e Silva (1794-?) e Luiz de Castro e Silva (1796-?). 

Rita Angélica casou-se em janeiro de 1807 (16 anos de idade), na cidade de Cascavel,  com José Ignácio da Silveira e Silva (?-1843), filho do notável advogado José Ignácio da Silveira Gadelha, pernambucano de Igarassu, que foi o 1º tabelião de Aquiraz, e de Maria Ignácia Gadelha. Rita Angélica faleceu em Aquiraz aos 89 anos de idade e 37 anos de viuvez. Teve 8 filhos entre eles o Padre Pedro José de Castro e Silva (1811-1889), meu trisavô.

Aqui cabe ressaltar que o Padre Pedro era descendente, por parte de mãe, da família Castro e Silva e, por parte de pai, da nobre família Gadelha de Pernambuco. Seu tetravô, o português Manoel da Costa Gadelha veio para o Brasil servir na guerra contra os holandeses. Após a restauração de Pernambuco, Manoel reivindicou o status de nobreza (cavaleiro da Ordem de Cristo, capitão-mor e governador das armas do rio São Francisco), junto à corte portuguesa, a fim de compensar as perdas sofridas na guerra.

O filho caçula do Capitão Francisco Xavier de Castro e Silva, de nome Luiz, se fixou em Cascavel e se tornou agricultor e grande proprietário de terras na região de Tijucussu, próximo da praia da Caponga. Casou com Anna Gonçalves (Sinhá Aninha) e dessa união teve uma filha, Angelina Sabina, que veio a se casar com um membro da família Goes, gerando vários descendentes na cidade de Fortaleza.

O Padre Joaquim José (filho caçula do patriarca José de Castro e Silva), irmão do Capitão Francisco Xavier, viveu em concubinato com a irmã de Anna Thereza (mulher de Francisco), chamada Ignácia Maria de Jesus. Essas irmãs eram filhas do Capitão Antonio José Pereira Leite, português, nascido em Guimarães e de Angélica Francisca Rabelo Vieira. Esse Padre teve 2 filhos com Ignácia: Jose Marcos de Castro e Silva (1814-1867) e Joaquim Emygdio de Castro e Silva (1816-?).

José Marcos foi o 10 tabelião de Cascavel e seu cartório passou por mais de 5 gerações da sua família. Atualmente, um dos cartórios da cidade pertence aos descendentes dele. O segundo filho, Joaquim Emygdio, teve descendentes que incorporaram o nome Emygdio ou Emigdio, como segundo nome. Quase todos Emígdio de Castro do Ceará são provenientes do filho mais novo do Padre Joaquim. 

segunda-feira, 12 de julho de 2021

Onde investir em renda fixa com vencimento até 2 anos

O boletim Focus do Banco Central mostra projeções da expectativa do mercado para a inflação (IPCA), câmbio, preços administrados, meta Selic e outros índices. Segundo o último relatório Focus do dia 12/07/2021, a taxa SELIC deve chegar a 6,63% até o final de 2021 e se manterá neste patamar em 2022 com ligeira alta. Já o câmbio deve fechar o ano no nível de R$ 5,05 por dólar.

 

2021

2022

2023

IPCA

6,32

3,71

3,25

Câmbio

5,05

5,20

5,00

Meta SELIC

6,63

7,00

6,50

IGPM

18,35

4,60

4,00

Preços Administrados

9,70

4,50

3,75

Taxas projetadas pelo Relatório Focus do BC de 12/07/2021

O IBGE anunciou o IPCA do mês de junho de 2021 em 0,53%. Com isso, a inflação dos 12 últimos meses está no patamar de 8,35%, bem superior ao esperado, ocasionando pressão sobre os juros de curto prazo. Essa persistência da inflação em patamares elevados gerou nos últimos meses altas sucessivas da Selic, hoje em 4,25%, e provocou um sentimento de insegurança sobre possíveis desestímulos na economia para conter a inflação. Contudo, a curva de juros de longo prazo (que indica o nível de incertezas para o futuro) já é perceptível essa tendência com os juros DI com vencimento em 2027 saltando de 6,40% para 8,60%.

Se o COPOM aumentar a SELIC para 6,50% até o final de 2021 e mantiver a mesma taxa em 2022, o CDI terminará no ano de 2021 (acumulado) em 4,05% e manterá próximo de 6,50% em 2022, projetando uma taxa mensal de 0,52%.

Alguns analistas do mercado financeiro já trabalham com uma projeção de 8,50% para a taxa de juros. Outros acreditam que a taxa não passará de 7,50%, mas será superior a taxa de 6,50% projetada pelo Banco Central há uma semana atrás. Acredita-se que por causa da inflação e das eleições no ano que vem, os juros devem precificar para cima, principalmente se um candidato com visão mais socialista ganhar a eleição. No entanto, lembre-se que juros elevados é a principal medida do Banco Central para conter a inflação, mas por outro lado inibem o crescimento do País (PIB).

Considerando que o País tem passado continuamente por diversas crises desde o primeiro presidente (Marechal Deodoro) e que elas são de natureza moral, política, fiscal e econômica, pode-se afirmar, sem pestanejar, que o futuro do Brasil é incerto e sempre será. A instabilidade política e econômica atual não permite cravar uma inflação perto da meta projetada, e consequentemente, a precificação dos juros para cima é inevitável.  

Observando os ativos de renda fixa, de emissão bancária, ofertados pelo mercado no mês de julho, verifica-se uma maior oferta de ativos pós-fixados em CDI e de prefixados e uma pequena oferta de ativos atrelados ao IPCA. Isto deixa claro que as instituições bancárias estão céticas em relação a uma inflação em torno de 6,30% ao final de 2021 e mais descrentes ainda com a taxa projetada de 3,75% para 2022. A tabela abaixo mostra as taxas médias de CDB, LCI e LCA ofertados em 12/07/2021 pelo mercado de renda fixa, com vencimentos em 1 e 2 anos.

Ativo

Vencimento em 12/07/2022

Vencimento em 12/07/2023

 

Prefixado

Pós – CDI

IPCA+fixo

Prefixado

Pós - CDI

IPCA+fixo

CDB

8,00%

125%

Ipca+2,10%

9,55%

130%

Ipca+3,80%

LCI / LCA

7,00%

102%

Ipca+1,15%

7,70%

105%

Ipca+2,50%

Taxa média dos ativos com mais retorno em 12/07/2021

Em um artigo publicado neste blog em março passado, recomendei que os investidores aplicassem no curto prazo, no máximo dois anos diante das incertezas que atravessam o País e fugissem do longo prazo. Investimentos em ativos com vencimento para mais de dois anos é temerário no atual momento.

Diante do cenário pré-eleitoral, da pandemia de covid inacabada, do pessimismo do mercado, os investimentos em prazos curtos (até 2 anos), atrelados ao IPCA (inflação) devem oferecer um rendimento maior, mas não descartaria um CDB prefixado com taxa superior a 12% (difícil encontrar).

segunda-feira, 5 de julho de 2021

O jogo só acaba quando termina

Creso foi o último Rei da Lídia, região que hoje compreende a parte ocidental da Turquia. Viveu no século VI a.c. e foi considerado o homem mais rico do mundo daquela época, graças as minas de ouro do reino. Conta-se que Sólon, um dos sete sábios da Grécia, conhecido pela sua sabedoria, moral ilibada, dignidade e inteligência, visitou Creso em Sardes, cidade da Lídia, mas não ficou surpreso com a riqueza e nem demonstrou a menor admiração pelo rei. Enfurecido Creso perguntou se Sólon havia conhecido homem mais feliz que ele. Sólon respondeu não podia admirar a felicidade de um homem porque no decorrer do tempo essa felicidade poderia sofrer mudança, uma vez que o futuro é incerto e ainda não tinha chegado. O equivalente moderno das palavras de Sólon é “nada está acabado até acabar” ou como dizia Vicente Matheus, ex-presidente do Corinthians, “o jogo só acaba quando termina”.

 Até por volta de 550 a.c. o reino da Lídia fazia fronteira com o Império Medo ou Média, que por essa época foi tomado pelo exército de Ciro, o Grande. Diante do domínio dos Persas sobre o povo Medo, Creso procurou tirar proveito da situação para expandir suas fronteiras para leste. Sabendo que teria inevitavelmente de enfrentar os Persas, antes de confrontá-los enviou um mensageiro ao Oráculo de Delfos consultando sobre êxito das suas intenções de tomar as terras dos Medos. O Oráculo respondeu que se atravessasse o rio Hális, fronteira natural entre os reinos, com seu exército, acabaria por destruir um império.

Sólon havia dito a Creso, sobre sua riqueza e esplendor, que tudo que vem com auxílio da sorte pode ser tomado pela própria sorte (em geral, rápido e inesperadamente). Sólon também teria dito que não importa com que frequência algo tem êxito se o fracasso tem um preço excessivamente elevado.

Incentivado pela profecia do Oráculo, Creso avançou com seu exército, atravessou o rio Hális e tomou parte das terras dos Medos. Sabendo do ocorrido, Ciro, o Grande, reuniu suas tropas e atacou as forças lídias que sofreram perdas significativas, retornando para Sardes. Esta derrota implicaria que a profecia do Oráculo fosse na realidade cumprida, mas ao contrário do que Creso tinha imaginado, ou seja, ao cruzar o rio Hális, Creso levou à queda de um império, o seu. Em 546 a.c. Ciro dominou a Lídia e Creso foi morto na fogueira. Antes de morrer, Creso teria gritado: “Sólon, você tinha razão”.

Hoje, muitas pessoas no Brasil, principalmente as vacinadas contra covid, tem se comportado como Creso, apesar do futuro incerto da pandemia. Ouço diariamente pessoas dizendo que já tomaram as duas doses da vacina e, por isso, estão imunizadas, não precisam do distanciamento, podem aglomerar e não usam máscaras. Se Vicente Matheus estivesse vivo diria que a pandemia de covid só acaba quando termina. 

quarta-feira, 16 de junho de 2021

A Ditadura da Minoria - 2a e Última Parte

Renormalização

Para analisar como a minoria aumenta suas preferências sobre as vontades da maioria emprega-se um método chamado de grupo de renormalização, um poderoso aparato da matemática, que permite investigar como as coisas aumentam (ou diminuem) na regra da minoria. 



A Figura 1 mostra uma sequencia de caixas semelhantes que apresentam as mesmas propriedades do conjunto de Cantor (https://pt.wikipedia.org/wiki/Conjunto_de_Cantor). Cada caixa contém quatro caixas menores. Cada uma das quatro caixas menores contém mais quatro caixas menores ainda, até chegarmos a um determinado nível de tamanho. Essa figura denota uma autosimilaridade fractal (https://pt.wikipedia.org/wiki/Fractal). Na 1ª caixa existem duas cores: amarelo para a maioria, e rosa para a minoria.

A 1ª caixa da figura está dividida em 4 caixas menores, onde cada caixa está em um quadrante do plano cartesiano cujo centro é o mesmo da caixa maior. Por sua vez, a caixa do quadrante IV (corresponde a caixa que está na parte de baixo a direita) está dividida em outras 4 caixas menores, sendo que uma delas está na cor rosa. Suponha que a caixa do quadrante IV represente uma família de quatro pessoas. Um delas está na minoria intransigente (caixa rosa contida no quadrante IV) e come apenas comida AGM free (Alimentos Geneticamente Modificados). Os outros membros da família estão na cor amarela. Suponha que a filha teimosa (caixa rosa contida no quadrante IV) consegue impor sua regra aos outros três membros e, consequentemente, a unidade (família) assume a cor toda rosa, ou seja, opta por comida AGM free (2ª caixa da figura). Houve então a primeira renormalização.  

Agora, suponha toda a família indo para um churrasco com a participação de outras três famílias. Como eles são conhecidos por comer apenas AGM free, os anfitriões cozinharão apenas comidas não modificadas geneticamente. A mercearia local percebendo que a vizinhança agora é apenas comedora de AGM free, resolve vender este tipo de alimento para simplificar a vida, o que impacta no atacadista local, e as histórias se repetem e se “renormalizam”. A última caixa da figura (enésima caixa) está toda na cor rosa após várias renormalizações.

O físico francês Serge Galam (https://en.wikipedia.org/wiki/Serge_Galam) foi o primeiro a aplicar essa técnica de renormalização às questões sociais e à ciência política. Imagine que um partido de extrema esquerda ou de direita tem o apoio de dez por cento da população. Então, seu candidato teria dez por cento dos votos? A resposta é não. Esses eleitores da base devem ser classificados como "inflexíveis" e sempre votarão no candidato do seu partido. Mas alguns dos eleitores flexíveis também podem votar nesse partido e essas pessoas são as únicas a serem observadas, pois podem aumentar o número de votos para o partido extremista. Os modelos de Galam produziram uma série de efeitos contra intuitivos na ciência política e suas previsões mostraram-se muito mais próximas dos resultados reais do que o consenso da maioria.

No exemplo anterior da família e da renormalização foi visto o efeito do “veto”, ou seja, uma pessoa em um grupo pode orientar as escolhas. Isto explica por que algumas cadeias de fastfood, como o McDonald's, prosperam, não porque oferecem um ótimo produto, mas porque não são vetadas em um determinado grupo sócio-econômico. Quando há poucas escolhas, o McDonald's parece ser uma aposta segura. Pizza é a mesma história: é uma comida aceita comumente para refeição noturna, pois ninguém ficará aborrecido por comer pizza no jantar.

Nassim Taleb concluiu que todo o crescimento da sociedade, seja econômica ou moral, vem de um pequeno número de pessoas. O risco de incertezas tem um papel preponderante na condição da sociedade. A sociedade não evolui por consenso, votação, maioria, comitês, reuniões verbais, conferências acadêmicas e pesquisas. A sociedade evolui quando poucas pessoas são suficientes para mover o mundo de maneira desproporcional. Tudo o que se precisa é de uma regra assimétrica em algum lugar, e a assimetria está presente em quase tudo.


 

segunda-feira, 14 de junho de 2021

A Ditadura da Minoria - 1a Parte

Em agosto de 2016 Nassim Taleb escreveu um artigo interessante, em inglês, sobre a ditadura da pequena minoria. Nassim Taleb é um autor de livrosestatístico e analista de riscos (https://en.wikipedia.org/wiki/Nassim_Nicholas_Taleb). Seus livros tratam das incertezas e dos eventos imprevisíveis. Pessoas e empresas podem se beneficiar e até crescer com certos eventos imprevisíveis, segundo ele. Uma interpretação resumida do artigo de Nassim é apresentada a seguir.

Há situações em que uma minoria intransigente, talvez 3% ou 4% da população total, é suficiente para submeter suas preferências a todos indivíduos. Um observador ingênuo ficaria com a impressão de que as escolhas e preferências são as da maioria, mas não são. Parece absurdo. Instituições acadêmicas e científicas não estão preparadas para identificar esse tipo de comportamento e fazem julgamentos precipitados, principalmente quando os sistemas são complexos.

A idéia principal por trás de sistemas complexos é que todo o conjunto se comporta de maneira não prevista pelos componentes. As interações importam mais do que a natureza das unidades. Por exemplo, estudar formigas de forma individual nunca nos dará uma idéia de como funciona a colônia de formigas. Para isso, é preciso entender uma colônia de formigas, como ela se comporta. Isso é chamado de propriedade "emergente" do todo, pela qual partes e todo diferem, porque o que importa são as interações entre as partes. As interações podem obedecer a regras muito simples. A regra discutida neste artigo é a regra da minoria.

A regra da minoria mostra que é preciso ter um pequeno número de pessoas intolerantes, mas virtuosas, corajosas e arrojadas, para a sociedade funcionar adequadamente. Exemplos da regra da minoria são dados a seguir.

Uma pessoa com deficiência não usará o banheiro regular, mas uma pessoa sem deficiência usará o banheiro para pessoas com deficiência”. Na prática, às vezes hesitamos em usar o banheiro para deficientes sob a crença de que o banheiro é reservado para uso exclusivo deles.

Alguém com alergia a amendoim não vai comer produtos que tenham como ingrediente o amendoim, mas uma pessoa sem tal alergia pode comer produtos sem traços de amendoim”. Isto explica por que é tão difícil encontrar amendoins em aviões.

Uma pessoa honesta nunca cometerá atos criminosos, mas um criminoso pode se envolver prontamente em atos legais”. Lampião e Pablo Escobar são exemplos.  

A minoria forma um grupo intransigente e a maioria um grupo flexível. A regra é assimétrica em relação às escolhas. Mas para que a regra da minoria aconteça, duas coisas são importantes. Primeiro, a estrutura espacial da distribuição da minoria. Faz uma grande diferença se os intransigentes estão em seu próprio bairro ou se estão misturados com o resto da população. Por exemplo, se as pessoas que seguem um governo minoritário vivem em guetos, com sua pequena economia separada, então a regra da minoria não se aplica. Mas, quando uma população tem uma distribuição espacial uniforme e a proporção de tal minoria é a mesma no bairro, cidade, estado e país, então a maioria (flexível) poderá se submeter à regra da minoria. Em segundo lugar, a estrutura de custos é importante. Por exemplo, uma indústria de alimentos que oferta produtos AGM (alimentos geneticamente modificados) e AGM free (naturais). Se a diferença de custos na produção desses alimentos for pouca, então é preferível produzir somente AGM free, uma vez que atende tanto a maioria flexível quanto à minoria intransigente. 

terça-feira, 8 de junho de 2021

O Préstito do Padre Pedro

O Padre Pedro José de Castro e Silva faleceu em 29/01/1890 em Fortaleza. Era um homem muito rico, com várias propriedades e residia, na época da sua morte, a Rua Senador Pompeu, antiga Rua da Amélia, do lado da sombra no número 210. Muito antes comprara oito casas vizinhas e conjugadas a sua e dera para cada um dos seus filhos.

Já muito adoentado, no leito da morte, mandou chamar o tabelião de Fortaleza, bem cedo ao raiar do dia, para fazer o testamento. Este o encontrou já nos últimos estertores. Recebeu e registrou os legados dos filhos (o Padre os chamava de sobrinhos), que saíram por entre soluços da pré-agonia.

Gustavo Barroso em seu livro Liceu do Ceará (*) conta que o tabelião disse ao padre que tinha conhecimento da existência de um herdeiro legítimo, não nomeado no testamento, e que era dever dele lembrá-lo para que não houvesse omissão.

O Padre indagou em voz sumida:
- Quem é?

O tabelião nomeou-o:
- O Dr. Manuel Ambrósio da Silveira Torres Portugal, seu sobrinho.

O moribundo recostou-se mais nos travesseiros e, fazendo o gesto vulgarmente chamado de armas de São Francisco, expirou com essas palavras:
- Deixo-lhe uma banana!

Por essa razão, em Fortaleza, quando se perguntava a alguém o que havia deixado um parente rico acabado de morrer, a resposta era fatal: uma banana!

Esse rancor do Padre, transformado em cólera, ao sobrinho era reflexo de sério desentendimento que tivera com seu cunhado, o português Manuel Antonio Torres Portugal, pai de Manuel Ambrósio, por questões financeiras e de propriedade. O português o acusara de vender seu estabelecimento situado na cidade de Jardins, CE, e de não ter recebido o dinheiro da venda. Por sua vez, o padre o acusava de ser ingrato, pois o ajudara na sua chegada e instalação em Fortaleza vindo de Portugal. Essa desavença se estendeu por vários anos.

O velório começou no domicílio do Padre no mesmo dia e foi até o fim da tarde do dia seguinte à espera do filho que morava na região de Redenção, Ce. Puseram o caixão na sala de visita, ladeado por quatro velas enormes que deveriam arder até o fim e na porta de entrada da casa uma negra cortina com uma grande cruz prateada ao centro. Irmãs, filhos e filhas, cunhados e cunhadas choramingavam pelos cantos, rezando o terço freneticamente. A noite foi longa, a espera do dia seguinte.

Naquela época não existiam automóveis para derradeira viagem. Os enterros eram verdadeiras procissões, a pé, que podiam se estender por quilômetros. No dia seguinte, abria o préstito uma cruz negra de cujo pedestal pendia uma saia, que era um pano de veludo preto com franjas douradas. A frente ia o cura da Sé (catedral) paramentado e dois coroinhas, e logo atrás vinha o féretro, levado por quatro homens, vestidos de casacas compridas pretas, com cartolas de oleado reluzente e calças com listras vermelhas. Esses homens eram chamados de Gatos-Pingados.

Otacílio de Azevedo conta no seu livro Fortaleza Descalça (**) que os Gatos-Pingados eram um dos aspectos mais curiosos da Fortaleza antiga. Eram contratados para levar o defunto ao cemitério. O pesado esquife era equilibrado sobre duas tábuas em cujas pontas havia aldrabas seguras pelas mãos enluvadas dos sinistros carregadores, num ritmo macabro e cadenciado. O caixão dançava naquelas mãos num vaivém funambulesco, arrancando lágrimas nos olhos da população curiosa que se aglomerava no trajeto até o cemitério. Quando o cortejo era pequeno, costumava-se dizer “não deu quase ninguém, só alguns gatos pingados!”. Creio que o nome dado se deve a duas coisas: a vestimenta preta, como se fosse um gato preto, representa a má sorte que atingiu o defunto e o pingado é a cachaça (pinga) que esses homens tomavam antes e depois do enterro.   

O acompanhamento foi feito por homens e mulheres, todos de luto, silenciosos e compungidos. A procissão se estendeu por quase 1.000 metros, ao longo da rua das Flores, hoje rua Castro e Silva, (daí talvez a origem do antigo nome da rua). Tão grande percurso, realizado sob as intempéries da natureza e sobre um calçamento pouco convidativo às longas caminhadas, assumia contornos de sacrifício. Em certo momento, um dos gatos-pingados tropeçou em uma das pedras soltas e quase caiu, mas ajudado pelos outros o cortejo logo seguiu. A noite se aproximava e tochas e archotes foram acesas, costume antigo e lúgubre. O ritmo era tão lento que parecia que os vivos não tinham pressa em se verem livres dos mortos, nem estes pressa em se verem livres dos vivos.

Terminado o préstito, os acompanhantes retornaram pesarosos, silenciosos e tristes. No dia seguinte os parentes do Padre adotaram os costumes da época. Durante um mês, a família só saia de casa para assistir a missa do sétimo e do trigésimo dia. Só escrevia cartas tarjadas de preto e usava luto fechado – os homens, terno preto, inclusive a camisa, as mulheres, vestido comprido e totalmente negro, a cabeça coberta com um véu. Naquela época, desoladas viúvas e viúvos trajavam luto fechado pelo resto da vida.

O próximo artigo abordará estórias e “causos” do padre Pedro.

(*) BARROSO, Gustavo. Memórias. Liceu do Ceará. 3. ed. Fortaleza: Casa de José de Alencar - UFC, 2000.

(**) AZEVEDO, Otacílio de. Fortaleza descalça: reminiscências. 2. ed. Fortaleza: Casa de José de Alencar - UFC, 1992

 

 

segunda-feira, 31 de maio de 2021

Os Vários Ramos da Família Castro

Não se pode considerar que todos os Castros existentes no Brasil, mesmo procedentes de Portugal, sejam parentes, porque são inúmeras as famílias que adotaram este sobrenome pela simples razão de ser de origem geográfica. Abaixo alguns ramos da família Castro.

Família CASTRO BARBOSA
Importante família estabelecida em Minas Gerais. A união dos dois sobrenomes teve princípio em Antônio Luiz Barbosa da Silva, da importante família Barbosa da Silva de Minas Gerais.

Família CASTRO CAMARGO
Família estabelecida em São Paulo. A união dos dois sobrenomes teve princípio no Sargento-mor Miguel Ribeiro de Camargo, natural de Curitiba, Paraná.

Família CASTRO CANTO E MELO
Importante e nobre família originária das ilhas portuguesas estabelecida em São Paulo, para onde passou o brig. João de Castro Canto e Mello [1740, Ilha Terceira – 1826, SP], filho de João Batista de Canto e Melo e de Isabel Rickettes. A marquesa Domitila de Castro Canto e Mello [27.12.1797, SP – 03.11.1867], amante de D. Pedro I descende dessa família.

Família CASTRO CARNEIRO
Família de origem portuguesa estabelecida em São Paulo, para onde passou Bento de Castro Carneiro [c.1691, Freguesia de N.S. da Boa Viagem de Massarelos, Porto, Portugal].

Família CASTRO E COSTA
Família estabelecida no Maranhão, que passou para o Amazonas, na pessoa do cap. Nicolau José de Castro e Costa [1833, São Luiz, MA], filho de João Pedro de Castro e Costa e de Luiza «de Castro e Costa». Deixou numerosa descendência, em Manaus (AM).

Família CASTRO E GAMA
Importante família estabelecida no Pará, que, por seus mais variados casamentos, nas principais famílias da região, originou diversos grupos, mais conhecidos por seus duplos sobrenomes. Teve princípio em Agostinho Brandão de Castro [c.1785]. A família Castro Martins do Pará descende da família Castro e Gama.

Família CASTRO LEÃO
Importante família estabelecida no Pará, à qual pertence Hugolino de Castro Leão [c.1860 – d.1920].

Família CASTRO LIMA
Família estabelecida na Bahia, à qual pertence o cap. Manuel de Castro Lima [c.1834, BA – 1885], filho de Antônio de Castro Lima e de Guilhermina Rosa.

Família CASTRO NOVO
Família originária da Itália estabelecida em São Paulo, para onde passou Vítor Antônio de Castro Novo [Nápoles – 1658], filho de Renato de Castro Novo e de Loaisa.

Família CASTRO NUNES
Família estabelecida no Rio de Janeiro. A união dos dois sobrenomes teve princípio no Dr. João Francisco Leite Nunes [cas. por volta de 1887, com Teresa da Conceição de Castro]. Há outra família com este sobrenome estabelecida em Pernambuco, à qual pertence Agostinho Luna de Castro Nunes.

Família CASTRO PEREIRA
Família da Bahia, procedente do cap. Francisco de Castro [c.1582 – 1645, BA].

Família CASTRO QUEIROZ
Antiga família de Minas Gerais, que teve princípio em Severino Barbosa de Castro.

Família CASTRO RABELO
Família estabelecida na Bahia, à qual pertencem o Dr. João Batista de Castro Rebello e outros. Um dos ramos dessa família estabeleceu-se no Pará.

Família CASTRO E SILVA
Antiga e importante família originária das ilhas portuguesas estabelecida em Aracati, Ceará, para onde passou o cap.-Mor José de Castro Silva [1709, Ilha de S. Miguel]. Um dos seus ramos passou para o Piauí (Valença), na pessoa de Elesbão de Castro e Silva, nat. do Ceará.

Família CASTRO MENEZES
Ramo da família Castro e Silva, do Ceará. Importante família do Ceará. A união dos dois sobrenomes teve princípio no cap.-Mor José de Castro Silva (2.º) [1749, Aracati, CE – 1807], filho de outro José de Castro Silva (1.º), patriarca desta família Castro e Silva, do Ceará.

Família CASTRO E SOUZA
Família de origem portuguesa estabelecida em Minas Gerais, que teve princípio no Alferes Joaquim de Castro e Souza [c.1792, Portugal]. Deixou descendência em São João Del Rei, Minas Gerias. Há, no Rio de Janeiro, outra família com este sobrenome.

Família CASTRO VASCONCELOS
Ramo dos Pereira de Vasconcelos, de Minas Gerais. A união dos dois sobrenomes teve princípio no tenente-coronel de Cavalaria, Felipe Joaquim da Cunha e Castro [c.1783, Vila Rica, MG -1841].

Família CASTRO VIANA
Família estabelecida em São João Del Rei (Minas Gerais), que teve princípio em Marcos da Silva, nat. de Portugal, que deixou descendência de seu casamento, c.1747, com Maria de Castro. Há no Ceará, a mesma família com esse nome que teve início com o português capitão-mor Antônio de Castro Viana.