sábado, 12 de março de 2022

Aqui nesta casa (Palácio da Luz) não se dança mais!

O Palácio da Luz, que por anos e anos, foi a sede do governo do Ceará, nasceu no último quartel do século XVIII como residência particular do capitão-mor Antônio de Castro Viana (português), tesoureiro da Fazenda Pública.

Foi construído pelos índios que utilizaram tijolo de coco e barro, extraídos das margens do rio Cocó, e caiado e entelhado com materiais oriundos do Aracati.

O capitão-mor faleceu em 1801, deixando uma grande dívida em favor do erário. Por esta razão a Junta da Fazenda Pública penhorou o prédio e o vendeu à Câmara Municipal da Vila de Fortaleza pela elevada quantia de oitocentos mil réis.

Como a Câmara não dispusesse desse dinheiro criou imediatamente um novo imposto (como se faz nos nossos dias), o curioso subsídio das águas ardentes. O imposto consistia, segundo o historiador João Brígido, na cobrança de quatro mil réis sobre a pipa de cachaça importada de Pernambuco. Desta forma, quanto mais se bebesse cachaça na terra de Nossa Senhora d’Assunção mais cedo se pagaria o Palácio.

Em 1809, o prédio foi trocado por outro, para onde se mudaram os edis, passando a funcionar como sede do governo da Capitania do Ceará-Grande. O título famoso de “Palácio da Luz” foi-lhe dado, naturalmente, após a Abolição da Escravatura, da qual o Ceará foi precursor histórico.

As paredes do Palácio suportaram, em 1892, o bombardeio dos canhões La Hitte de 12 polegadas, ordenado pelo comandante da Escola Militar, por ocasião da deposição do general Clarindo de Queiroz

Estas mesmas paredes receberam os tiros e as pedradas partidos das barricadas populares, quando em 1912 foi apeado do poder o velho oligarca Nogueira Acioli.

Durante anos, os habitantes das cercanias do Palácio e os sem teto que dormiam nas adjacências da Praça General Tibúrcio falavam de sons de música, murmúrios e arrastás de pés que pareciam vir de lá, na calada da noite, como se houvesse uma festa. Eram os fantasmas dançarinos do tempo do governador Matos Peixoto. O Governador José Carlos de Matos Peixoto governou o Ceará entre 12 de julho de 1928 a 08 de outubro de 1930, ao ser deposto pelo governo provisório de Getúlio Vargas. 

Ao final da década de 1920, Matos Peixoto costumava promover todos os sábados um animado baile no Palácio, quando, como diz o povo, “enrascava” a noite toda com sua mulher, a simpática Da. Violeta, na prazerosa companhia de seus correligionários prediletos, os chamados “maravilhas”, e na animação das valsas, polcas e mazurcas.

Em 1930, vitoriosa a Revolução de Vargas, a massa popular enxotou o governador festeiro, pondo em seu lugar o líder aliancista Fernandes Távora, que foi trazido diretamente da prisão para o Palácio.

Antes de ser deposto, Matos Peixoto vendeu o sítio que possuía no bairro do Benfica, chamado de Vila Tebaida, para o meu avô, Gervásio de Castro e Silva. Esse sítio situava-se onde hoje está o shopping Benfica. Matos Peixoto saiu fugido as pressas de Fortaleza em 1930 e deixou várias coisas nesse sítio, inclusive o retrato da mulher (Da. Violeta)  pintado à óleo em um grande quadro.

E, no meio da euforia e algazarra que costumam incendiar esses momentos de exaltação política, alguém colocou uma faixa sobre o frontispício do Palácio da Luz, em que se podia ler:

Nesta casa, a partir de agora, não se dança mais!

Outras histórias e outros fantasmas estão ligados à mitologia deste prédio, que também sediou a Casa de Cultura Raimundo Cela e hoje abriga a mais antiga academia de letras do Brasil.

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